A infertilidade se define como a incapacidade para conceber depois de um ano de relações sexuais sem proteção (depois de seis meses se a mulher tiver mais de 35 anos), ou como a incapacidade de levar adiante uma gravidez até o nascimento de um bebê vivo. Mesmo num ciclo menstrual perfeitamente estabelecido, a possibilidade de gravidez é de 15 a 18%. Entretanto, a possibilidade de gravidez a cada ciclo acumula e a chance de um casal sem problemas engravidar no primeiro ano chega a 96%.
Suspeitar de infertilidade pode causar frustração, ansiedade e aflição. A princípio, alguns casais resistem em procurar um médico e admitir que existe um problema. Mas quanto mais rápido buscarem ajuda, mais rápido poderão resolvê-lo. Também é importante dizer que a infertilidade é um problema do casal, não de uma só pessoa, e culpar um ao outro é contraproducente.
A Sempre Materna conversou com o ginecologista e obstetra Assumpto Iaconelli Jr., diretor do Fertility – Centro de Fertilização Assistida e Vídeo Endoscopia Pélvica, que esclarece as dúvidas sobre reprodução assistida.
Quais são as principais causas de infertilidade feminina?
As causas mais comuns são endometriose, alterações nas trompas e alterações nos ovários, freqüentemente ligadas à idade.
E da infertilidade masculina?
Para o homem, as principais causas são varicocele, falência testicular, doenças sexualmente transmissíveis, infecções seminais, disfunções hormonais, anatômicas e genéticas.
Quando o casal deve recorrer à reprodução assistida?
Após um ano de tentativas sem nenhum método contraceptivo, é o prazo acadêmico para se iniciar uma investigação, podendo variar para mais ou menos, dependendo da idade e histórico do casal.
Quais são os métodos de reprodução assistida mais utilizados atualmente e em que caso cada um é indicado?
Os procedimentos são divididos em baixa complexidade, como coito programado e inseminação intra-uterina (colocação do sêmen, previamente preparado no laboratório, na cavidade uterina, no período ovulatório), e alta complexidade, como FIV – fertilização in vitro – e ICSI – injeção intracitoplasmática de espermatozóide. Os casos de baixa complexidade tratam casais com problemas de anovulação ou alterações seminais leves, os demais casos devem ser tratados por métodos com maior complexidade.
Como são feitas a ICSI e a FIV?
A ICSI está indicada, principalmente, nos casos de fator masculino severo, quando a quantidade de espermatozóides é muito baixa ou ausente na ejaculação. O procedimento auxilia o processo de fertilização através da injeção direta de um espermatozóide no citoplasma do óvulo. Os óvulos são preparados para a injeção, e os espermatozóides são imobilizados mecanicamente. A seguir, o espermatozóide é aspirado, pela cauda, para dentro de uma pipeta. O óvulo então é fixado e o espermatozóide é injetado delicadamente em seu interior. Na FIV, após a estimulação da ovulação, a paciente tem seus óvulos coletados por aspiração, com auxílio de ultra-sonografia, sob anestesia local e sedação leve. Os óvulos são levados ao laboratório de gametas onde são identificados e classificados. Quatro a seis horas depois, os óvulos são inseminados com aproximadamente 100 mil espermatozóides móveis. No segundo dia se avaliam as características da divisão dos embriões e a transferência é feita em 48 ou 72 horas após a coleta dos óvulos.
Quais são as chances de resultados positivos?
Na indicação de uma inseminação artificial, o espermatozóide precisa realizar todo o processo natural, ou seja, percorrer o sistema reprodutor feminino até encontrar o óvulo e fertilizá-lo. Sendo assim, o casal terá uma probabilidade de gravidez de 18% a cada tentativa. O número pode parecer baixo, mas para o casal com problemas de infertilidade, sem este recurso, a chance de gravidez seria muito menor, às vezes até impossível. Já com a fertilização in vitro as chances de gravidez podem alcançar 50% a cada tentativa. Não podemos deixar de destacar que a idade da mulher interfere muito neste processo; a partir dos 40 anos o percentual de sucesso cai para 15% e aos 45 fica próximo a zero.
Até onde vai o poder da medicina?
Todos os casos de infertilidade podem ser resolvidos através da reprodução assistida ou há casos em que não há solução? A boa notícia é que desde que tenhamos um óvulo, um espermatozóide e um útero, não existe por que não conseguir uma gestação. Sabemos que em 40% dos casos o problema de infertilidade está ligado à mulher, em outros 40% ao homem e os demais 20% têm causas comuns. O casal além de todas as técnicas da medicina reprodutiva também pode contar com a doação de sêmen, óvulos e até mesmo de embriões, dependendo do diagnóstico de seu problema.
A reprodução assistida gerou um aumento significativo de gravidez múltipla. O que é possível fazer para evitar este cenário?
A gravidez múltipla ocorre porque transferimos mais de um embrião. Ela deve ser evitada por causa das complicações obstétricas e neonatais resultantes e, para isso, é preciso limitar o número de embriões transferidos. Em nossa clínica, há alguns anos, desenvolvemos um score embrionário – método de classificação mais minucioso para selecionar o embrião. Com esse procedimento, transferindo apenas dois embriões, temos uma probabilidade de gestação de 50% e de gemelaridade de 30%. Apesar de ser um percentual altíssimo (na natureza, ocorre uma gemelar a cada 80 gestações), é um pré-natal relativamente tranqüilo desde que observados os cuidados recomendados pelo obstetra. Ter sucesso não é simplesmente ficar grávida, mas, sim, ter um bebê saudável.
Quantos embriões recomendam-se implantar a cada fertilização atualmente?
O Brasil não dispõe de nenhuma lei específica definindo o número de embriões a serem transferidos para o útero. Segundo o Conselho Federal de Medicina, as clínicas de reprodução humana assistida devem transferir no máximo quatro embriões, porém, devido ao aprimoramento das técnicas, o número de trigêmeos e quadrigêmeos aumentou de forma exponencial e, conseqüentemente, as complicações decorrentes também aumentaram. Por isso, a maioria das clínicas já reduziu para dois o número rotineiro de embriões transferidos.
Quais os principais riscos da gravidez múltipla?
Complicações para a mãe, como a pré-eclampsia (aumento da pressão arterial no período de gestação), sangramentos, diabetes gestacional, maior risco de abortamento, trabalho de parto prematuro e infecções pós-parto. Já o feto pode nascer prematuro, com malformações e restrição de crescimento. A gravidez gemelar pode levar ainda ao vanish twim ou gêmeo desaparecido, ou seja, crianças que nasceram como filho único, mas que em algum momento da gestação dividiram o útero com outro bebê. Calculase que 15% das crianças nascidas como únicas provenientes das técnicas de reprodução assistida participaram desta situação. Para que isso ocorresse, um dos fetos não foi viável e desapareceu em algum momento de seu desenvolvimento. Quanto mais tardio é esse desaparecimento, piores são as conseqüências para o feto que continuou se desenvolvendo. A principal complicação pode ser a paralisia cerebral, patologia não tratável e de conseqüências desastrosas à criança e à família.
O que é feito com os embriões não utilizados?
Este é um assunto que atualmente está no centro das atenções por conta da utilização ou não de embriões em pesquisas com célulastronco. Em nossa clínica, todo casal ao iniciar o tratamento deve determinar em contrato o que será feito com os embriões excedentes. Alguns casais optam pelo descarte, outros preferem deixar o material congelado para uso futuro ou até mesmo para serem doados.