O importante é que tenha saúde. Frase comum entre as gestantes, mas o que as mamães mais querem é que seu filho venha “perfeito”. Nos ultrassons contam os dedinhos, ouvem as batidinhas do coração, veem o perfil e os primeiros traços do pequeno, mas, também, podem saber sobre as questões genéticas.
Durante os exames essenciais do pré-natal o casal pode receber algumas surpresas boas e outras nem tanto assim. As doenças cromossômicas estão entre as principais causas de óbito intra-uterino e déficit mental na infância, porém, se descobertas no período gestacional, podem ser tratadas com mais facilidade.
A gravidez é uma fase de muita alegria e que as mães planejam e sonham com um bebê que muitas vezes não é o real, criam um filho imaginário e, com isso, correm o risco da decepção. É importante ter a consciência que dentro desse universo encantador da maternidade, alguns contratempos podem aparecer.
A medicina fetal é uma grande aliada dessa fase e oferece procedimentos e tecnologias avançadas para obter resultados precisos. Segundo pesquisas, é possível descobrir 80% dos casos de anomalia cromossômica fetal. Para entender melhor como e porque essas alterações acontecem o Docente da Faculdade de Medicina da USP, responsável pelo Setor de Medicina Fetal, Maternidade São Luiz, Dr. Adolfo Liao, explica os tipos comuns de doenças cromossômicas na gestação.
Quais são os exames necessários para detectar possíveis problemas com o bebê na gestação?
Para confirmar a saúde dos bebês antes do nascimento, recomenda-se realizar a ultrassonografia morfológica fetal na 12ª e 20ª semanas de gravidez. Esses exames permitem avaliar o risco de doenças cromossômicas e diagnosticar as malformações fetais.
Quais são as doenças cromossômicas comuns na gestação?
A anomalia cromossômica mais comum é a Síndrome de Down (também chamada de trissomia do cromossomo 21), que é observada em cerca de uma criança a cada 600 nascimentos.
O que causa a Síndrome de Down?
O ser humano tem, no interior do núcleo de cada uma de suas células, 46 cromossomos, organizados em 23 pares (numerados de um a 22, mais um par de cromossomos sexuais).
Na Síndrome de Down, cada célula passa a ter 47 cromossomos, devido a uma cópia a mais do cromossomo 21. A anomalia cromossômica é caracterizada por fácies típica, com olhos amendoados, língua proeminente e déficit intelectual variável. Também podem apresentar malformações associadas, como no coração e no sistema digestivo.
Como acontece essa combinação?
A formação do zigoto (ou ovo) ocorre pela união de um óvulo, de origem materna, com um espermatozóide, de origem paterna. Normalmente, cada uma das células reprodutivas contribui com 23 cromossomos. Quando há quantidade errada de cromossomos, no óvulo ou espermatozóide, ocorrem as anomalias cromossômicas, resultando em uma cópia a mais ou a menos de um cromossomo.
Qualquer doença cromossômica pode ser detectada ainda no pré-natal?
Atualmente, por meio de exames ultrassonográficos e estudos genéticos, é possível diagnosticar a maioria (de 70 a 80%) dos casos de anomalia cromossômica fetal. No entanto, parte dessas crianças não apresenta quaisquer manifestações ultrassonográficas que permitam diferenciá-las de fetos normais.
Quando é possível descobrir alguma alteração?
As malformações fetais podem ser diagnosticadas a partir de 12 semanas de gestação.
Quais são as semanas gestacionais ideais para a realização dos exames?
Recomenda-se que o primeiro ultrassom morfológico seja realizado entre a 11ª e a 13ª semana. O segundo exame morfológico deve ser realizado preferencialmente ao redor de 20 semanas.
Quais as possibilidades de tratar as alterações cromossômicas ainda no ventre?
As anomalias cromossômicas não apresentam possibilidade de tratamento definitivo. Contudo, diante do seu diagnóstico, é possível preparo e planejamento adequados do parto de acordo com as necessidades específicas, como nas situações em que há malformação cardíaca grave associada.
Como é feita a verificação dos cromossomos na gestação?
A verificação do número de cromossomos que a criança apresenta, durante a gestação, é realizada por meio de exame denominado cariótipo fetal. Para tanto, é necessária coleta de amostra de material por meio de punções da cavidade uterina, como a biópsia de vilo corial (coleta da placenta), amniocentese (coleta de líquido amniótico) e/ou cordocentese (coleta de sangue).
Esses procedimentos causam riscos à gestação?
São procedimentos com caráter invasivo, pois envolvem a introdução de uma agulha no interior da cavidade uterina. Os riscos incluem: parto prematuro, ruptura da bolsa
amniótica, sangramento e até a perda da gestação. O risco é de aproximadamente 1%.
O que pode provocar essas alterações cromossômicas?
As anomalias cromossômicas são frequentemente associadas à idade materna avançada. Contudo, podem ocorrer mesmo nas gestantes jovens e o mecanismo exato responsável pela alteração cromossômica não é conhecido. Portanto, não há formas efetivas de sua prevenção.
O que são os testes de rastreamento e para que servem?
Os testes de rastreamento são exames simples, realizados rotineiramente em indivíduos assintomáticos e considerados de baixo risco, e servem para identificar um subgrupo com risco aumentado para determinada doença de interesse. Nesse subgrupo, realizam-se testesconfirmatórios para a doença em questão. Outros exemplos na área de ginecologia e obstetrícia seriam o rastreamento do câncer de mama por meio da mamografia e o rastreamento do câncer do colo uterino por meio do exame de Papanicolau.
Qual a probabilidade de erro desse teste?
Cerca de 5% dos casos normais são identificados erroneamente como alterados nos exames de rastreamento. Enquanto que cerca de 80% das gestações com anomalia cromossômica serão corretamente identificadas.
Os exames de ultrassom podem ajudar nesse processo?
A medida da translucência nucal, além da pesquisa de outros sinais ultrassonográficos, constitui hoje tempo fundamental no processo de rastreamento das anomalias fetais.
A idade materna pode influenciar no problema cromossômico?
Há um aumento da frequência de crianças com anomalias cromossômicas com o aumento da idade materna. Por exemplo, o risco para Síndrome de Down na mulher com 25 anos é de aproximadamente um para cada 946 gestações, ou 0,1%. Para uma mulher com 35 anos, este risco é de um para 249 (0,4%). Entretanto, mesmo em gestantes com idade avançada, a maioria das crianças são saudáveis.
Caso a mulher tenha sofrido com esse problema na primeira gestação, quais as chances de ter também nas próximas?
Nos casos em que a mulher tem história de gestação anterior acometida por doença genética, uma consulta de aconselhamento genético é recomendada. O risco de recorrência varia de acordo com a anomalia identificada na gestação anterior. Na Síndrome de Down, esse risco é de cerca de 1% acima do risco de outra mulher, em idade semelhante, que não apresente o mesmo antecedente. Para outras anomalias, o risco de recorrência é praticamente nulo.
Como deve ser feita a Medicina Fetal?
A Medicina Fetal é uma área de atuação dentro da Obstetrícia e Ginecologia que já tem mais de 50 anos de história. Atualmente, existem profissionais especializados que acompanham todas as etapas do desenvolvimento embrionário e fetal, desde as primeiras semanas após a fecundação até o momento final, próximo ao parto. O principal recurso diagnóstico utilizado é a ultrassonografia e, por meio dela, é possível realizar a avaliação do risco genético, diagnosticar possíveis malformações, além de avaliar o bem-estar e a vitalidade fetal no terceiro trimestre.
Doenças genéticas podem ser consideradas também um acaso ou falta de sorte do casal?
A maior parte das doenças genéticas ocorre de forma esporádica e não tendem a se repetir. Mas, diante de qualquer antecedente suspeito ou confirmado, recomenda-se consulta de aconselhamento genético, preferencialmente pré-concepcional, para melhor caracterização do risco de recorrência. Uma vez que algumas doenças têm caráter hereditário e podem ocorrer com maior frequência em gestações subsequentes.
Para os casais que planejam a gestação, quais são as dicas para prevenção?
O ideal seria realizar uma consulta pré-concepcional para:
– diagnosticar e tratar eventuais doenças maternas
subclínicas;
– ajustar a dose ou até mesmo trocar eventuais medicações de uso crônico;
– iniciar suplementação, antes mesmo da concepção, com ácido fólico para prevenção dos defeitos do tubo neural;
– realização exames para identificação de riscos infecciosos;
– vacinação de mulheres suscetíveis à rubéola;
– identificação dos riscos genéticos para adequado planejamento de exames adicionais.