A evolução da medicina fetal vem ocorrendo de forma muito rápida.
Desde os anos 80, quando a primeira cordocentese (coleta de sangue fetal através de punção do cordão umbilical) foi realizada na França, novas técnicas surgiram. Atualmente, é possível realizar exames muito mais sofisticados e precisos, tanto na área de diagnose como, em alguns casos, cirurgias fetais intra-útero. E com a descoberta de novas tecnologias, como a ultra-sonografia tridimensional (3D), várias informações estão sendo avaliadas no exame morfológico fetal.
Realizados sobretudo na primeira metade da gravidez, os exames pré-natais são a maneira mais segura de diagnosticar doenças genéticas, congênitas e de má-formação do feto. Já é possível detectar precocemente problemas que podem ser corrigidos ainda no útero, a partir da vigésima semana de gestação, sem grandes riscos para a mãe ou para o feto.
Sempre Materna entrevistou o Prof. Dr. Antonio Fernandes Moron, chefe do departamento de Obstetrícia da UNIFESP e diretor clínico do Centro Paulista de Medicina Fetal, que esclarece algumas dúvidas sobre o tema.
Do que se ocupa exatamente a Medicina Fetal?
Medicina Fetal é um conjunto de procedimentos com finalidade preventiva, diagnóstica e até mesmo terapêutica no sentido de avaliar e assistir a saúde fetal. Além de se ocupar de gestações consideradas de risco, como idade materna avançada, consangüinidade, infecções, doenças maternas com repercussões no crescimento e desenvolvimento fetal, malformações congênitas e incompatibilidades sangüíneas, a Medicina Fetal se ocupa de aconselhamento genético reprodutivo prégestacional, rastreamento e diagnóstico de anomalias fetais, utilizando exames ultrasonográficos, bioquímicos e moleculares.
Quando surgiu a Medicina Fetal?
A Medicina Fetal passou a se constituir como um verdadeiro ramo do conhecimento com o advento da ultra-sonografia e o aprimoramento dos métodos de avaliar a maturidade e vitalidade fetal nos anos 80. Na UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), a Medicina Fetal foi formalmente estabelecida em 1988.
Os exames para avaliar as condições do feto devem começar em que fase da gravidez?
Desde o primeiro trimestre de gravidez é possível avaliar a saúde fetal, particularmente entre a décima-primeira e a décima-quarta semana.
Considerando uma gravidez normal, com que freqüência a ultra-sonografia deve ser repetida?
Pelo menos um exame no primeiro trimestre, entre a décima-primeira e a décima-quarta semana. A ultra-sonografia morfológica de segundo trimestre por volta da vigésima semana e mais uma no terceiro trimestre para avaliar o crescimento e desenvolvimento fetal. Entretanto, a qualquer momento, o exame ultrasonográfico poderá ser realizado na gravidez diante de uma indicação médica. Não existe nenhuma evidência científica de que fazer muitas ultra sonografias possa prejudicar a saúde do bebê.
Quais as ultra-sonografias mais importantes e o que elas avaliam?
Ultra-sonografia morfológica do primeiro trimestre para rastreamento das anomalias fetais entre 11 e 14 semanas com medida da translucência nucal, osso nasal e dopplervelocimetria do ducto venoso. Ultra-sonografia morfológica do segundo trimestre, por volta de 20 semanas, cujo principal objetivo é diagnosticar as malformação. Inclui o estudo detalhado da anatomia fetal, do crescimento fetal e de marcadores de risco fetal. Ultra-sonografia endovaginal entre 21 e 24 semanas para identificação de mulheres de risco para parto prematuro, através da medida do colo uterino.
A ultra-sonografia permitiu uma série de procedimentos que dão acesso à cavidade uterina. Quais são os procedimentos invasivos mais comuns para saber o que está acontecendo dentro do útero?
Vale lembrar que procedimentos invasivos são aqueles em que há um risco de aborto após sua realização. É, portanto, necessário haver indicação médica consistente para que a gestante não corra riscos desnecessariamente. Entre os procedimentos mais comuns estão: amostra do vilo corial para estudo cromossômico fetal e em algumas circunstâncias para estudo molecular do feto para identificação de doenças gênicas. Amniocentese para estudo cromossômico fetal e em algumas circunstâncias para estudo molecular do feto para identificação de doenças gênicas. Estudo da maturidade pulmonar fetal e na espectrofotometria do líquido amniótico.Cordocentese a partir de 20 semanas para estudo cromossômico, infeccioso, metabólico e hematimétrico do feto.
Que tipos de exames bioquímicos podem ser feitos para avaliar as condições do feto?
Os estudos bioquímicos deixaram de ter um papel relevante para diagnóstico e rastreamento das anomalias fetais em função do desenvolvimento da ultra-sonografia, entretanto, os exames Alfafetoproteina, Teste triplo e Proteína plasmática A continuam sendo realizados com sucesso em muitos países.
Qual a diferença entre o acompanhamento de uma gestação de risco de uma gestação normal?
Em primeiro lugar a necessidade de um profissional com amplo conhecimento na área, disponibilidade de equipamentos e laboratório associados a visitas mais freqüentes com o intuito de identificação dos fatores de risco, como diabetes, hipertensão e cardiopatias.
Que tipos de problemas podem ser corrigidos intraútero?
Há vários problemas que podem ser sanados ainda dentro do útero. Anemia, aumento ou redução do volume de líquido amniótico, hidrocefalia, derrames pleurais, defeitos cardíacos, obstruções urinárias e mielomeningocele são as anomalias mais importantes que podem ser revertidas durante a gestação. Infecções graves como toxoplasmose, doença urbana transmitida por gatos, pombos e carnes mal passadas podem ser tratadas com medicação adequada durante a gestação sem afetar o cérebro, a visão ou o coração da criança que vai nascer.
Existem procedimentos cirúrgicos que podem ser feitos no feto durante a gravidez?
Em alguns casos de problemas cerebrais, pulmonares ou renais a cirurgia fetal endoscópica é recomendada. O índice de sucesso em cirurgias pulmonares é de 76%. Em cirurgias renais, 47%. E em cirurgias cerebrais, 96%.
Que cuidados as gestantes devem ter para prevenir problemas de malformação ou de crescimento do feto?
A Medicina Fetal avançou muito nos últimos 20 anos no Brasil, mas é preciso fazer um alerta sobre a prevenção. Cuidar da alimentação, parar de fumar e ingerir álcool, além de evitar medicamentos que possam prejudicar o feto são atitudes fundamentais mesmo antes de engravidar. Muitos problemas sérios poderiam ser evitados com atitudes preventivas. A mulher deve procurar desenvolver um estilo de vida com qualidade, particularmente durante o planejamento pré-concepcional. Quando já estiver grávida, manter uma alimentação adequada, hidratação, repouso, auto-estima e uma assistência pré-natal personalizada e freqüente garantem, quase sempre, uma gestação tranqüila.
“A medicina fetal avançou muito nos últimos 20 anos no Brasil, mas é preciso fazer um alerta sobre a prevenção.”