Na maioria dos bebês, há uma pequena saída de leite pela boquinha depois das mamadas. São as chamadas regurgitações, que acontecem sem esforço e sem interferir no ganho de peso.
Segundo a neonatologista, Clery Bernardi Gallacci, esses vômitos são comuns e geralmente causados pela deglutição excessiva de ar. “Pode ser causado também por um processo de refluxo gastroesofágico fisiológico, que consiste no retorno do leite do estômago para a boca por causa de uma imaturidade funcional do estômago e do esôfago, mas são episódios esporádicos e que não causam maiores danos”, afirma.
A regurgitação passa a ser um problema quando começa a interferir no desenvolvimento da criança. Ela apresenta sintomas como dificuldade para ganhar peso, febre, choro frequente, intranquilidade, chiado no peito, crises de apneia e infecções nas vias aéreas repetidas vezes. “Nesse caso, ela pode estar sofrendo de refluxo gastroesofágico patológico, um processo mórbido, na maioria dos casos autolimitado, em que ocorre a presença de conteúdo gástrico no esôfago”, diz.
A causa do problema quase sempre é a imaturidade do esfíncter, a válvula muscular que regula a passagem do leite do esôfago para o estômago e vice-versa. “Nos casos de refluxo patológico, além do leite, voltam também os sucos gástricos usados na digestão, que provocam irritação do esôfago e muita dor e queimação”, explica. Uma parcela menor de casos pode ainda ser causada por malformações anatômicas, alterações neuro-hormonais ou dos neurotransmissores envolvidos na região esôfago-gástrica.
Segundo a neonatologista, o refluxo pode ser diagnosticado pela história clínica dos sinais e sintomas citados, através de provas terapêuticas posturais ou medicamentosas, e nos casos mais importantes por diagnósticos subsidiários de avaliações radiológicas, cintilografia, estudo da manometria esofágica, monitorização do pH esofágico, ultrassonografia e endoscopia. “Vale lembrar que outras patologias, como processos obstrutivos na região gastroesofágica, casos de alergia ao leite de vaca, toxicidade alimentar até doenças neuromusculares, devem compor o leque de diagnósticos diferenciais de refluxo gastroesofágico”, alerta.
O tratamento inclui atitudes posturais, como a orientação de manobras eficientes para o bebê arrotar após as mamadas; a manutenção do aleitamento materno, e, no caso de bebês que já estiverem recebendo outros alimentos, fracioná-los em pequenas quantidades; evitar líquidos gasosos, sucos de laranja e tomate, café e excesso de líquidos; e evitar a elevação das cabeceiras dos berços com travesseiros para prevenir acidentes de sufocação dos bebês com os mesmos. “Outra medida comumente usada, mas que não recomendo, é engrossar o leite, o que em muitos casos pode piorar o tempo do esvaziamento gástrico”, aconselha a médica.
Além dessas medidas, às vezes é indicado o uso de medicamentos destinados a aliviar a irritação do esôfago, diminuir a acidez do estômago ou para esvaziá-lo mais rápido. Em raríssimos casos, há necessidade de correção cirúrgica do esfíncter. “Alguns casos de hérnia de hiato e epigastralgia (dor de estômago) na vida adulta podem estar relacionados com o refluxo gastroesofágico na infância, mas geralmente o problema tende a desaparecer depois de um ou dois anos de idade”, diz.